segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A violência começa na mente- continuação Parte 2

Lorenz é autor de dois livros sobre o tema: Sobre a agressão (1963) e Por trás do espelho: uma pesquisa por uma história natural do conhecimento humano (1973). No primeiro, ressalta que nos animais a agressividade tem um papel positivo para a sobrevivência da espécie, como o afastamento de competidores e a manutenção do território. “Também no homem a agressividade poderia ser orientada para comportamentos socialmente úteis”, opina o etólogo. Na segunda obra, ele especula sobre a natureza do pensamento e da inteligência humana e seu poder de sobrepujar as limitações reveladas por seus estudos, argumentando ainda que a luta e a guerra no homem têm uma base inata, mas que isso pode ser modificado. Por suas descobertas, Lorenz recebeu o Prêmio Nobel de Fisiologia em 1973.
Os encrenqueiros
Nas escolas, eles são conhecidos como praticantes do bullying (do inglês, ameaçar, intimidar). São crianças e adolescentes que praticam a violência física e psicológica entre seus colegas. Hoje disseminado também na internet (cyberbullying), o bullying compreende todas as formas de atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação evidente, adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), causando dor e angústia, e executadas dentro de uma relação desigual de poder. Portanto, os atos repetidos entre iguais e o desequilíbrio de poder são as características essenciais, que tornam possível a intimidação da vítima. “Nos rapazes, é mais fácil que certas emoções se traduzam em atos violentos”, diz o psicanalista Antonino Ferro. Esses jovens são influenciados por vários fatores: menos controle e mais coesão. Nas “manadas humanas”, reproduz-se um mecanismo de raiva animal (lembrem-se das torcidas organizadas). O assunto é sério: basta ver que uma pesquisa sobre bullying, realizada na Grã-Bretanha, registra que 37% dos alunos do 1º grau e 10% do 2º grau admitem ter sofrido bullying uma vez por semana, pelo menos. Também no Brasil, um estudo da Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (Abrapia), envolvendo 5.875 estudantes da 5ª à 8ª séries de 11 escolas da cidade do Rio de Janeiro, revelou que 40,5% deles admitiram ter estado diretamente envolvidos em atos de bullying em 2002, sendo 16,9% alvos, 10,9% alvos/autores e 12,7% autores de bullying. Normalmente, os meninos estão mais envolvidos com o bullying, tanto como autores quanto como alvos. Já entre as meninas, embora ocorra com menor frequência, o bullying se caracteriza, principalmente, como prática de exclusão ou difamação. Mas o que fazer? Como saber se uma criança praticará bullying? Melhor certificar-se de educá-la bem e observar até que ponto os seus acessos de raiva contra as coisas e as pessoas são sérios, acompanhando muito de perto o desenvolvimento de sua personalidade.
Para muitas teorias sociológicas, a agressividade destrutiva é aprendida em nosso meio social – a sociedade na qual vivemos influencia nosso comportamento, afirmam. Por sua vez, Freud diz que também as pessoas muito místicas e pacíficas podem esconder a crueldade e o sadismo infantis. Embora inerente à natureza humana, nem todo mundo exprime a violência do mesmo modo. Os inuits, do Ártico, por exemplo, não agridem, mas isolam o indivíduo. Segundo descreve o antropólogo Andrea Drusine, os arapesh da Nova Guiné são citados como um exemplo de povo pacífico. Se dois rapazes brigam, são separados por um adulto e treinados para descarregar a ira não em um semelhante, mas sobre as coisas.
Também os índios hopis, da América do Norte, reprimem a agressividade física e não gostam de competições. Ao contrário, aprendem a sorrir até mesmo para os inimigos. Em compensação, têm uma língua afiada como uma navalha envenenada. Outras tribos do continente, como os cheyennes, eliminavam sua agressividade golpeando duramente os inimigos com as mãos. Quando nos encontramos em perigo (por exemplo, diante de uma cobra), a imagem chega ao tálamo, uma área do cérebro de onde é levada ao córtex visual e à amídala, glândula que envia a resposta de defesa (aumento do batimento cardíaco, adrenalina).
Utkin Aleksandr/AFP
NOS ESTÁDIOS A polícia enfrenta as torcidas organizadas à custa de sua própria vida.
Emil Cocarro, neurologista da Universidade de Chicago (EUA), acredita que a bioquímica cerebral de alguns indivíduos irritáveis é programada pela ira. As pessoas que apresentam uma carência do neurotransmissor serotonina são mais sujeitas à cólera. “É preciso imaginar”, escreve Drusini, “que, quando qualquer pessoa nos faz uma desfeita, algumas estruturas de nosso cérebro são estimuladas a reagir de maneira agressiva”. Então, o córtex cerebral media e faz uma avaliação, perguntando: você quer dar um soco naquele rapaz? Essa ponderação nos fornece um tempo para raciocinar, mas, se o sistema da serotonina não funciona, o impulso não é freado e o córtex frontal não intervém a tempo. Resultado: acaba-se partindo para a agressão.
Revista Planeta