segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A violência começa na mente- Parte 1



O que motiva alguém a fazer o mal para outra pessoa? Um cérebro diferente, um DNA criminoso, problemas hormonais, pais ausentes... As hipóteses são muitas, mas uma coisa é certa: a agressividade é um instinto inato, que tem muito a ver com o amor


POR FABÍOLA MUSARRA
Revista Planeta
Shutterstock
Enquanto aguardava minha vez de comprar o ingresso para o cinema, um casal começou a discutir. As acusações foram aumentando, assim como o tom das vozes. Como todos na fila, disfarcei e fingi não estar vendo aquela cena. Mas o que eram vozes alteradas transformaram-se em berros, até que o rapaz atingiu a garota com um tapa. A confusão aumentou. Desisti de assistir ao filme. Nem era mais necessário: já tinha recebido uma overdose de emoção para o dia. No caminho de volta, uma pergunta me inquietava: o que faz alguém brigar assim? De onde vem toda essa agressividade?
Obviamente, aquele casal não é uma exceção. Todos os dias, cenas de violência invadem a tela da tevê, passeiam pelas ondas do rádio ou desfilam pelas páginas dos jornais e das revistas. Nas metrópoles, elas já se tornaram corriqueiras: acontecem diariamente na porta de casa, no interior dos condomínios e das escolas, nas ruas, no trânsito, nos semáforos, nos estádios... Brigas, assaltos, assassinatos, atropelamentos, crimes. Enfim, retratos da perversidade praticada pelo ser humano.
Tão antiga quanto a própria humanidade, a agressividade também frequenta o universo bíblico. Quem não se lembra da história de Caim e Abel? Na Bíblia, Caim invejava o irmão e acabou por assassiná-lo. Mas não importa o lugar, nem quem ou como a violência é exercida, a verdade é que qualquer um de nós pode ter gestos de extrema agressividade, pois eles fazem parte da natureza humana. Em certos casos, a violência é resultado da força e do físico também. Afinal, só briga e é valentão quem pode, não é mesmo?
Engana-se quem responsabiliza os distúrbios psicológicos pelo fato de nem sempre conseguirmos ter o controle sobre os nossos instintos mais brutais. Ao contrário: muitos psiquiatras asseguram que mesmo as pessoas consideradas “normais” podem praticar um assassinato. Como? Por quê? Primeiramente, porque a agressividade é uma herança de nossos instintos mais primitivos, quando tínhamos de nos defender de toda espécie de perigo, das intempéries climáticas a animais de grande porte. Assim sendo, é uma parte importantíssima de cada um de nós. Afinal, é a agressividade que permite responder à altura e no mesmo tom a uma pessoa que nos insulta – e, nesse caso, é chamada de atitude defensiva.
DISSIMULAÇÃO As pessoas que sofrem de transtorno da personalidade antissocial costumam importunar, desrespeitar, mentir e manipular os outros, a fim de obter vantagens pessoais.
A personalidade antissocial
Também conhecido como psicopatia ou sociopatia, o transtorno da personalidade antissocial apresenta-se como um padrão invasivo de desrespeito e violação dos direitos dos outros, que começa na infância ou no início da adolescência e prossegue na idade adulta. Enquanto algumas pessoas conseguem administrar bem os conflitos, outras têm uma visão distorcida da realidade e, assim, são levadas a canalizar a violência. É o caso de quem sofre de transtorno da personalidade antissocial. Centradas apenas em si mesmas, essas pessoas desdenham os outros e querem redimir a carência, a falta de amor (real ou imaginária) do passado. Em geral, elas não se adaptam às normas sociais e podem realizar repetidos atos que constituem motivo de detenção, como destruir propriedade alheia, roubar, importunar e desrespeitar os desejos, os direitos ou sentimentos alheios. Também enganam ou manipulam os outros, a fim de obter vantagens pessoais ou prazer. “Podem ainda mentir repetidamente, usar nomes falsos, ludibriar ou fingir”, explica a psicóloga Joana Patrícia Dias. Como ocorre? Se uma criança é negligenciada pela família, não aprende a avaliar adequadamente as consequências das suas ações e passa a cometer gestos atrozes sem sentimento de culpa. Em certos casos, se ela percebe que a mãe está ausente e reage ao distanciamento materno para se defender, guardando distância dos semelhantes, isso na prática significa que passa a desrespeitar a lei e sucessivamente os outros.
O BULLYING COMPREENDE TODAS AS FORMAS DE ATITUDES AGRESSIVAS ADOTADAS POR UM OU MAIS ESTUDANTES CONTRA OUTRO(S)
Em alguns casos, a agressividade deixa de ser apenas um mecanismo natural de defesa, passando a ser uma bomba-relógio, prestes a explodir. Fundador da moderna etologia (o estudo do comportamento animal), o zoólogo austríaco Konrad Lorenz (1903-1989) afirma que quando a agressividade vem antes do amor, ela é um desvio: “Esse tipo de agressividade é uma violência em si mesma: é a mola que impulsiona certos homens a cometer massacres ou genocídios.”

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